Médica veterinária supera síndrome de burnout e se torna escritora

Desde que mudou radicalmente de carreira, em 2020, Ana Suarez já escreveu cinco livros. É também fundadora da Editora Flow, que publica livros com histórias inspiradoras, e da...

Desde que mudou radicalmente de carreira, em 2020, Ana Suarez já escreveu cinco livros. É também fundadora da Editora Flow, que publica livros com histórias inspiradoras, e da mentoria “Um livro para chamar de seu”, na qual ensina pessoas a escreverem uma obra literária

Ana Suarez brinca que sempre teve o dom de trabalhar com as mãos. Se não fosse isso, o que explicaria todos os trabalhos aos quais se dedicou na vida estarem relacionados à destreza manual? Ana formou-se em Medicina Veterinária, para trabalhar com reprodução animal; fez sua carreira na reprodução assistida humana, com “mãozinhas de fazer embrião”, e hoje se dedica a arte de escrever, tendo cinco livros publicados até o momento. Essa última atividade, levou-a fundar a editora Flow, que se dedica a publicar livros com histórias inspiradoras, e a mentoria “Um livro para chamar de seu”, onde ensina os alunos a escrever e publicar uma obra literária.

A vocação de Ana para contar histórias inspiradoras, fica claro, vem de sua própria biografia repleta de episódios marcantes: alguns tristes, outros terríveis, a maioria edificantes, mas nenhum que possa ser ignorado. Destaque para quando, depois de sofrer com uma série de doenças debilitantes, uma das quais a impossibilitou de sair da cama, descobriu que estava sofrendo de síndrome de burnout. Para conseguir sobreviver, precisou desacelerar seu ritmo. Fazendo isso mudou drasticamente sua vida profissional.

Nascida em Ipameri, interior de Goiás, em 1974, Ana viveu sua infância e adolescência em Anápolis (GO). Não teve a participação de seu pai em sua criação e precisou enfrentar os inúmeros desafios que isso significava nos idos da década de 1970. Sua mãe teve que se desdobrar para criá-la, costurando dia e noite, e, ao mesmo tempo que forneceu as condições necessárias para que Ana progredisse, lhe colocou muita “pressão sobre os ombros”, que foram cobrar seu preço anos depois.

Segundo a mãe, Ana precisava cumprir dois objetivos primordiais na vida: se formar e ser doutora. Alfabetizada desde os três anos, e com noções básicas do idioma inglês desde os cinco anos de idade, ao ingressar na escola, com a mesma idade, ouviu as seguintes palavras de sua progenitora: “Hoje começa seu caminho rumo à Universidade     ”. Ana precisava levar os estudos a sério para conseguir realizar tudo que sua mãe, com as melhores intenções de mãe,  aspirava para ela e não se furtou ao desafio: foi, desde então, a melhor aluna da turma e, deixando em segundo plano todas as distrações que a adolescência costuma trazer, ingressou no curso de Medicina Veterinária da Universidade Federal de Goiás (UFG), aos 17 anos.

A opção pela veterinária se deve ao fato de Ana, quando criança, tentar fazer pequenas cirurgias nos passarinhos que caíam no quintal de sua casa, feridos por balas de chumbinho. Sua especialização (reprodução animal), no entanto, cristalizou-se anos depois, no último ano da faculdade. Na época, a mãe de Ana já havia descoberto uma oportunidade de estudo no exterior que se tornaria  o estágio profissional da filha na França. Certa ocasião, tempos antes de viajar, Ana foi a um congresso e encantou-se com uma palestra ministrada por um especialista francês em reprodução animal. Ao final da apresentação, apresentou-se a ele falando perfeitamente o seu idioma, o que lhe cativou a ponto de que oferecesse um estágio a ela quando viajasse à França. Assim se deu. Na França tornou-se pupila desse especialista, participando da maior equipe de reprodução animal do mundo.

Após seis meses, Ana voltou para Goiânia, pois precisava terminar sua formação acadêmica. A estadia na França, contudo, embora curta, lhe rendeu bons contatos que foram importantes para sua carreira. Em função deles, por exemplo, estagiou, em Brasília (DF), no Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia – CENARGEN -, responsável pela primeira clonagem animal do Brasil, e adentrou ao mestrado em Reprodução Animal, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em Porto Alegre.

A época do mestrado foi decisiva para um dos períodos mais difíceis da vida da escritora. Lidando com um namorado ciumento de sua carreira,     e chantagista e com um orientador, por vezes temperamental e explosivo , Ana desenvolveu um câncer na tireoide. Em razão da doença, precisou adiar seu sonho (e o de sua mãe) de se tornar doutora. Foram três duros meses de tratamento, de onde emergiu com uma vontade imensa de viver a vida. Na ocasião, Ana já estava trabalhando no Hospital de Clínica de Porto Alegre, com reprodução assistida em seres humanos, e já terminara o namoro. Dividia seu tempo entre as novas atribuições profissionais e as festas com as amigas.

Essa rotina, no entanto, durou menos de um ano. Ana logo quis retomar os estudos para se tornar doutora. Cogitou voltar à França, a pedido de seu orientador da época, mas encontrou dificuldades em conseguir uma bolsa de estudos que custeasse seu doutorado naquele país. Dessa forma, parou mesmo foi na Alemanha. O período de um ano que passou entre aprovação no doutorado e a transferência para lá foi suficiente para que Ana começasse a namorar, noivasse e se casasse. Rudah, que, passados 20 anos, continua seu marido, trancou a faculdade de medicina em Porto Alegre para apoiar       os sonhos de Ana na Alemanha e fazer parte de seu ano prático em renomados hospitais em Dresden e Munique.

De volta ao Brasil, dois anos depois, a já doutora em Biotecnologia se deparou com uma situação inédita até aquele momento em sua vida: o desemprego. Para manter a si própria e a seu marido, que ainda cursava faculdade, começou a produzir pães artesanais de centeio, seguindo receita aprendida na Alemanha. Surgiu então a “Pão da Doutora”, que fez muito sucesso pelo curto período em que esteve em atividade. Assim que Ana voltou a trabalhar com reprodução assistida, engravidou, dando a luz à sua filha, Anita, em março de 2008.

Em busca de mais segurança para a família, ela e Rudah decidiram se mudar para Florianópolis (SC). Mas a ideia promissora na teoria mostrou-se equivocada na prática. Na capital catarinense, receberam cartas que ameaçavam a segurança de sua família. Apavorados, resolveram deixar o país. Aproveitando os contatos feitos no seu doutorado, Ana conseguiu um emprego em Munique, na Alemanha. O fato de a escritora ter um avô, por parte de pai, espanhol facilitou a transferência para terras estrangeiras, pois ela obteve cidadania espanhola, o que permitia trabalhar no país europeu.

Na Alemanha, o que era um recomeço logo se transformou em pesadelo. Por divergências de princípios e valores no hospital de reprodução assistida onde trabalhava, se demitiu. Como seu marido ainda não havia obtido autorização para atuar como médico no país, ficaram os dois, por um tempo, sem rendimentos. A fim de aliviar a situação familiar, Ana aceitou ocupar um cargo de chefia ao qual não desejava na época, pois já estava pensando em desacelerar seu ritmo de vida. As consequências foram desastrosas para sua saúde. Tempos depois, foi diagnosticada com síndrome de burnout e por ordem do psiquiatra afastou-se do emprego. “Nunca mais voltei para trabalhar. Ali, foi minha aposentadoria da época de veterinária”, afirma.

Nas sessões de terapia, Ana descobriu que “estava arrastando o mundo”, desde os cinco anos de idade.     a. “Na ânsia de fazer tudo perfeito, acabei esquecendo de mim. Hoje, eu sei que preciso me colocar em primeiro lugar, pois, estando bem comigo mesma, eu consigo fazer muito mais pelos outros”, diz. Buscando um novo sentido para a vida, Ana começou a fazer diversos cursos livres: comunicação, coaching e até sobre fitoterapia e florais de bach. Em uma mentoria, foi despertada para o poder transformador da literatura. Por causa de sua carreira acadêmica, já havia exercitado muito a leitura e a escrita, ao revisar textos para revistas internacionais e escrever teses e dissertações. Acreditou, então, que poderia se tornar escritora.

E, assim foi. Em setembro de 2020, já em Lucerna, na Suíça, para onde se mudara dois anos antes em busca de mais estabilidade financeira, Ana lançou seu primeiro livro, a obra infantil, “A Liga da Identidade”. Quase um ano depois, em maio de 2021, terminou a primeira parte de sua trilogia autobiográfica, “Minha história escrita à mão: eu sou”. Para publicá-la, em agosto do mesmo ano, fundou a Editora Flow, que leva esse nome, diz a escritora, por estar alinhada ao princípio da fluidez, pois todo o projeto foi construído de forma natural.

O fato de Ana ter publicado sua autobiografia por conta própria chamou a atenção de alguns seguidores em sua conta no Instagram. Diante do crescente interesse das pessoas em saber como ela havia conseguido tal feito, a escritora fundou a mentoria “Um livro para chamar de seu”, na qual orienta sobre como escrever uma obra literária. Ana ressalta que os livros que se enquadram na linha editorial da Flow – com foco em histórias inspiradoras – são publicados pela editora. “Até o momento, dos 18 mentorados que tive, oito já se tornaram autores da Flow, seis terão suas obras lançadas ainda neste ano e quatro não foram aprovados por não estarem em consonância com a linha editorial”, diz.

Atualmente, Ana já publicou, pela editora Flow, a segunda parte de sua autobiografia: “Minha história escrita à mão: eu mereço”; o guia para auxiliar no planejamento e treinamento de foco “Só hoje” e a continuação do seu livro infanto-juvenil: “A Liga da Identidade – a história de Ben”. Em breve, publicará o livro de oração “Eu e Meu Deus”, e a terceira parte de sua trilogia autobiográfica:  “Minha história escrita à mão: eu consigo”.