Whitney Houston, Vanuza, Fafá de Belém e Elza Soares. Divas em todas as suas faces foram reverenciadas no palco da Panteras, boate LGBT que funcionou em Cuiabá no final da década de 80. Quase três décadas depois, a exposição virtual “Pelos Olhos da Pantera”, lançada neste sábado (29), reconta esta história a partir das vivências de quatro frequentadores do local.
Da adaptação das roupas até a seleção para os shows, o cabeleireiro Ju Silva, o professor aposentado Adão Lesco, o produtor de festas e designer de fantasias Luciano Sousa e o pastor Joelson de Souza redesenham, por meio de suas memórias, uma parte da cena gay na capital de um dos estados com maiores índices de crimes de homofobia no Brasil.
“Eu tinha de 19 para 20 anos quando fui a primeira vez. Era viciante aquele lugar. Era um lugar onde você podia ser você mesmo. Nessa época a gente vivia em gueto, mas lá você podia se soltar, podia beijar na boca, podia viver. Até então eu não me aceitava, aí entrei lá e vi dois homens se pegando. Aí eu percebi que não era só eu que era assim, que tinha um monte de gente igual a mim, então eu não estava errado”, conta Ju.
Realizado com recursos da Lei Aldir Blanc, o projeto, que inclui minidocumentário, conta com pesquisa e curadoria do jornalista André Garcia e produção visual do fotógrafo Henrique Santian. Além disso, por meio da página é possível ter acesso à playlist do Spotify “Play na Pantera”, que reúne as principais músicas tocadas à época. Para acessar o site, basta clicar aqui: https://www.pelosolhosdapantera.com.br/.
De acordo com os entrevistados, a boate era fruto das reuniões no Jejé’s Dancing, antigo bar “GLS” no Beco do Candeeiro, quando o espaço ficou pequeno para as performances. Dali, o grupo migrou para a antiga boate Apocalipse, rebatizando-a como a felina. Os discos de dance, trazidos diretamente de Londres pelo gerente do estabelecimento, garantiam a trilha sonora que a deu fama e a diferenciava de outras casas.
Instalada na região do Coxipó, mais ou menos na altura em que as avenidas Fernando Corrêa e Miguel Sutil se cruzam, oferecia um espaço seguro de acolhimento e diversão. “Lá ia todo mundo: gay, hétero, travesti. Tinha famílias que iam assistir aos shows. Era um lugar acolhedor, sem violência, uma pessoa conhecia a outra e uma protegia a outra”, explica Luciano, um dos responsáveis pela escolha dos shows.
Com o movimento, as apresentações ganharam notoriedade e a lotação esgotada exigiu rigidez: as drags passavam por seleção e os shows eram submetidos a uma escala. “A gente fazia um apanhado na quinta-feira com todo mundo para pegar os melhores. Aí no sábado a gente já levava o filé para as pessoas verem o que tinha em Cuiabá de bom”, explica Luciano.
Em um dos pontos mais altos desta trajetória, Joelson lembra que a cantora Gretchen chegou a rebolar no palco, se apresentando ao seu lado. “Meu papel nessa época era a Gretchen. No dia, eu estava me preparando para o meu show quando chegou o aviso nesse dia que eu ia dublar com a Gretchen de verdade. Fiquei assustadíssimo. Ela disse que eu estava muito bem. Eu fico na minha modéstia.”
Panteras fechou suas portas em 1992. O que permanece unânime e intacto entre eles, contudo, é a saudade e o orgulho. “Nunca me senti mulher, meu desejo não era esse. Mas tinha a coisa do desafio da transformação. Quando você conhece alguém fora do palco e depois vê a drag no palco, é outra pessoa. Isso que fascinava a gente.”, conclui Adão Lesco.
Com informações da assessoria
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