Após uma publicação em que critiquei a postura do governo do Estado e demais poderes em determinarem o fechamento dos restaurantes às 19h, muitos se mostraram surpresos com algumas dificuldades do nosso setor.
Estou à frente de uma pizzaria desde 2014 e posso dizer que a crise advinda da pandemia (COVID 19) vai mudar radicalmente o cenário que conhecemos. Não falo apenas da crise financeira, mas também da forma de se pensar um restaurante.
A crise financeira se arrasta há tempos em nosso setor, sendo uma combinação explosiva que vem desde o pós-copa (2014), com atrasos de salários de servidores, retração no consumo, impeachment da presidente Dilma Rousseff e tantos outros fatores, até chegar a COVID-19.
Impressionante como muitos se reinventaram neste caminho. Não foi só a explosão do delivery via aplicativos que nos consomem quase 28% do custo do prato. Falo também de restaurantes que mudaram por completo seu serviço e cardápio, enxugando custos e tentando manter o negócio em pé. Passamos para a mídia digital, cardápio digital, ficamos responsáveis pelo lixo que produzimos, há uma infinidade de taxas, alvarás e penduricalhos. Dependemos cada vez mais de meios eletrônicos de pagamento, nosso pessoal teve que aprender a lidar com novas tecnologias e com postagens digitais. Tudo é para ontem!
Quem tem entrega própria é considerado quase insano, pois os riscos da atividade com entregadores são grandes, como acidentes, assaltos, golpes na entrega, etc. No final, a culpa sempre é do restaurante.
Já o público que decide sair de casa precisa de um algo mais, que vai além da comida boa. Eles querem uma experiência agradável e temos que nos esmerar para atender com cordialidade, educação, limpeza, decoração e assim vai. Um atendimento ruim, ou nem tanto, e dá-lhe mídia social negativa. As pessoas descontam suas mágoas de toda uma vida rapidinho. Neste caso, o que me incomoda é a desproporcionalidade.
Com a COVID, os restaurantes terão que pensar em outra arquitetura e repensar sua forma de servir. Pia na entrada para lavar as mãos, salas com ampla ventilação. Energia elétrica mais cara (janela aberta e ar ligado), fim do cardápio impresso, distanciamento maior entre as mesas, esterilização massiva de tudo, pessoal extra para limpeza e polimento de louças e metais.
O custo da operação será mais caro e isso refletirá no preço.
Não dá para fazer tudo isso das 17h às 19h como prevê o atual Decreto Estadual. É muito melhor fechar. Abrir um restaurante à noite é ligar luzes, manter refrigeração, colocar o pessoal à disposição dos clientes, manter o local impecável e receber um ou outro gato pingado que consome rapidinho por conta do horário restrito.
Restaurantes familiares não fazem aglomeração. Pequenos lanches de rua, onde a família sobrevive do espetinho, do cachorro-quente ou da pipoca, também não. A diferença é que abrindo só um pouquinho (até as 19h), não se fatura o suficiente para pagar o custo da operação. Não há milagre.
O Decreto não trouxe nenhum fôlego em relação a tributos e obrigações dos comerciantes. Como acho improvável que os que têm poder venham a renunciar a seus benefícios absurdos (auxílios e penduricalhos como transporte, moradia, educação, celulares e outros), precisamos dar um jeito. A conta é nossa! Para isso, temos que trabalhar e entendo que o melhor para todos seria permitir o acesso a esses locais até as 22h, mesmo que houvesse restrições para o álcool a partir de determinado horário.
Se alguém tiver outra solução que não seja trabalharmos para pagarmos os salários, tributos e aluguéis, por favor me apresente.
Antônio Carlos Tavares de Mello é advogado, atua há 15 anos no ramo de restaurantes e é membro da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (ABRASEL MT).